terça-feira, 26 de novembro de 2013

Resposta a Zé (Ramalho)

Há muito mais que violetas velhas
há amores guardados em abraços escondidos
e uma lua do outro lado da rua
bordados em mãos enrugadas
um resto de perfume nos frascos encostados no fundo do guarda-roupa
há suspiros rotos
estradas de passos estreitos
vielas de segredos largos
Nos jardins há promessas de sombra
nas sementes adormecidas
vontades de céu
em viventes terrestres.
Há guizos, sol invernoso de fim de tarde
Há espaços. Há soluços. Há felicidades.
E um colibri.

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Aurora florida

A espreitar por entre as folhas
pétalas e luz
nos olhos incandesciam
pequenas órbitas.
De que cores pintam os céus
os arcanjos que me depositam flores?

Amanhece todo tempo no jardim da minha vida.


Pela janela

Chegue para cá
espie pela janela
Diga para mim que é de esperança
o barulho nos paralelepípedos
Preciso de um abraço
de uma cartinha pelo correio
das coisas antigas que cabem nos frascos de lavanda.
Um espaço que cabe o mundo inteiro
Vem, segura minha mão
olha em meus olhos ora tristes.
Meu coração é passageiro.
Chegue para cá
e faça-me companhia.

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Brechas

As saudades que moram em mim
são de uma urgência sem fim
querem transformar-se em abraços
em flores, em abelhas,
em peregrinos, em oração.
São brechas, meu olhos, 
espiando muito além...

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Amor e clorofila

deixa que eu te fale desse amor
que me escancara dentes e peito
fortaleza sem paredes
remanso de águas claras
farfalhar de folhas ao vento
sem meia luz
sem meio termo:
ele entrou pelo jardim
contou segredos
pintou de rosa as rosas dos cantos
pôs cheiro de aurora nas telhas 
cantou junto com os pássaros nos beirais
e eu remoço quando suspiro
como plantinha que se enrosca
nas treliças dos poemas eruditamente apaixonados.

há caminhos que irei
-não sem segurar-te as mãos.

Hiato

os meninos cantavam, sorrindo, na esquina
era noite de novembro
ouvi aqueles versos
e, triste, lembrei da minha meninice ida
uma tristeza cheia de saudade
do cheiro do meu avô
dos abraços apertados do meu pai
das canjicas bem mexidas da minha mãe
(a melodia da vida
onde cada um executa um instrumento)
penduradas no meu varal
as brincadeiras no meio da rua
o feijão cheiroso da minha avó
os passeios de carro com a minha tia.

na verdade
não sinto tristeza
sinto muita saudade
de tudo quanto inflou meus olhos
e fez de mim essa mulher.

saudade da minha infância
cheia de goiabas, pinhas e siriguelas
de bolas e brincadeiras de roda
da menina que acreditava
(mais veementemente)
na natureza boa de todas as pessoas.


terça-feira, 12 de novembro de 2013

Entrelinhas

Trouxe meu peito aberto
cheio de desejo de ser feliz
segurando tuas mãos.
Coisa simplória de dizer
como raios de sol que tocam
a escuridão da madrugada.
Ofereço meus cheiros
de jasmim, de rosas,
das pequenas flores de limoeiro,
meus espaços vazios
minhas palavras reverberadas
em poemas de amor intenso.
Nas entrelinhas, ouça,
minhas visões de eternidade,
sinta, meu coração sobressaltado
apenas por saber de si.
Sua até o fim.

Janela das horas

Desejava janelas
Sim, janelas de onde pudesse avistar o horizonte sem fim
Por elas sairiam seus olhos
nelas debruçaria seu corpo
seus seios ávidos de cor.
Não queria portas
de largas passagens
sem o encanto do peitoril
Queria demorar-se em contar passarinhos
e escutar-lhes confessar segredos de árvore.
Eram as cores das horas
o encanto da observação
Era isso que desejava das janelas
que de longe acenavam.
A urgência do dia que adentrava pela porta
empurrou-a por seus ponteiros.

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

De olhos fechados e coração aberto

Mais e menos
café e chá
biscoito e bolacha
sombra e luz

Amor em saquinhos de pipoca
adocicado como jujuba
e abraços no cinema

Pusemos as mãos uníssonas
nos caminhos que percorremos
de pés descalços e som alto
corremos sobre as pedras e seixos redondinhos

Miúdas e brilhantes
branca e majestosa
uma era estrela dalva
as outras eram luas caleidoscópicas

O vento do mês de novembro
soprava manso pela porta
do meu lado um mundo inteiro
insistia em sair pelos meus dedos.

domingo, 10 de novembro de 2013

Crescente

No céu sorrindo
sorriso de lábios grossos
a lua imprime nos meus olhos
a vontade de continua a fitá-la.

Amor meu
entranhado no meu corpo,
aninhado como gato de armazém.

Promessas de luz
de lua
de abraços e pequenas entregas

A noite tem desses mistérios
que revelo ao olhar pela janela.
Esse cheiro de escuro
me dá vontade de abraçar.

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

(Re)encontro

Ah, que parte de mim esqueci
quando cruzei com teu olhos?
No meu peito
há muito mais do que um coração,
cabe um mundo inteiro
cheio dos teus cheiros,
de tuas mãos.
Ao ver-te, em meu braços,
encontro o que esquecida
deixei em ti,
dias de luz
como passarinhos em beirais,
alçando voos.

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Minhas escolhas

Eu escolho acreditar que posso ser melhor
ainda que não esteja fazendo do modo certo
que tenha abraçado menos do que queria
menos do que deveria.
Escolho ter um quintal grande e uma casa pequena
comprar livros no lugar de sapatos
ter amigos suficientes e paz de espírito.
Viro para o lado
e prefiro café forte e amargo
palavras poucas
e mais atitudes.
Caminho olhando as nuvens
e gosto mais de dias ensolarados
e menos de dias chuvosos e nublados
sem desfazer-me da graça de saber que Deus escolhe como o dia vai nascer.
Lambo minhas feridas
e macero ideias antes de revelá-las
Eu escolho amar todo dia os olhos que me encantam
por somente fitar-me
Eu escolho a simplicidade
e devo lembrar-me de que nas tribulações o mais fácil
é parar, rezar e seguir.
Eu escolhi ser mãe
decidi continuar sendo filha
e nesse caminho enlaço e desenlaço
sendo aprendiz e mestre.
Eu escolho ter fé,
ser feliz, andar a pé.
Escolho miudezas - engrandecem minha alma!

terça-feira, 5 de novembro de 2013

Descoberta

Todo pensamento é passarinho
há dias em que liberto colibris
noutros apenas um beija-flor
por dentro de mim
pintassilgos, cardeais, corujas,
gaviões, galinhas d'água.

Tendo tantas asas
resta-me gritar ao vento:
voa pensamento!

Decisão

Ficou pensando se amar não era uma questão de atitude, de querer mesmo.
Lembrou quantas vezes tinha decidido continuar amando e a contagem já não mais cabia nos dedos da mão. E não, não havia sido renúncia. Todas as pessoas que decidiu continuar amando foram escolhas.
De repente descobriu que amadurecera. Já podia falar das dores sem desmanchar-se, já sabia lidar com o desconforto de olhar nos olhos que foram facas, sem se cortar.

Por um momento desejou não ter tantas marcas, não ter tantas cicatrizes. Bobagem. Era a certeza da sua evolução. Engatou a primeira marcha, saiu lentamente rumo à respiração do mundo.

Amar era sim uma questão de atitude. E era isso que ela queria: continuar amando.

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

O segredo da lua

Dentro da lua um homem,
um cavalo,
um dragão.
Ponhamos ordem na lua!
Limpem essas patinhas
arrodeiem para o outro lado
é hora do jantar.
Lua minguante
e a cozinheira põe a sopa na mesa.

Remendando

Como se conserta um coração?
- perguntou, olhando-se no espelho, a menina de vestido florido.
Tornou-se mulher e ainda procura a cola, a linha, a agulha...

Essência

Surgiam de par em par
olhos e mãos
a lapidar palavras
a derramarem-se no leito aberto
pelos ritmados corações.
Eram segredos e melodias
eram desvelos, abraços simples
luz de estrelas no céu das bocas.
Ressurgiam nas madrugadas
reencontravam-se nas calçadas
nas mensagens de poucas letras.
Como taça de vinho
como talha de água
irmanados na essência.
Surgiam de par em par
- o plano era como rio que vai ao mar:
no final
não era o fim
era recomeço cerúleo das nuvens que os habitava.

Tão breve

Tão breve!
Quero apenas as coisas simples
Que não dão nós nos pensamentos
Que já moram em mim
Centelhas, flores,
Tardes sentadas no chão
Vendo o sol se pôr entre os galhos da algaroba
Tão breve!
a vida passa...
Dez, vinte,
de repente quarenta e um
E a noite já engole mais esse dia.
A promessa de eternidade
quando pó voltarei a ser
pó cósmico, universal.
Poeirinha de Deus.

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Urgência

Olho rapidamente
pelas janelas da vida
abertas ao meu redor
Aceleradamente
como criança descendo ladeira
descubro o mistério
de ser passageira
ou condutora.
Meu corpo pede calma
minha alma pede água
meu pés, sem descanso,
oferecem calos.

Despeço-me desse devaneio
no meio da tarde
A hora avança
os ponteiros trepidantes
apontam para fora.

Adeus às janelas
o mundo me aguarda
à soleira da porta.