Iridescente

a leveza das horas estava em seu vestido,
em seus olhos despreocupados
procurando por abelhas e besouros pelo canteiro
pensava silenciosa nos mistérios contidos em si mesma
indecifráveis, inefáveis
escondidos nas tramas que seus próprios passos traçavam
raios de sol nos seus cabelos
caneta e papel para letras desenhadas
era um domingo para seu coração
na praça os seus sonhos de flor fervilhavam

agora entardecia o tempo
vinha a noite engolindo as sombras
fazendo escuros os galhos
adormecendo os passarinhos

em sua bolsa guardou achados
guardou os brocados
guardou fechados
seus olhos
as mudas
as sementes.

a leveza das horas agora estava de si distante
aguardava o momento de despertar o dia.

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Regresso

e se de repente eu partir
como quem parte para não mais voltar
que a partida seja na primavera
porque eu gosto é de cheiro de jasmim

e se eu voltar, de surpresa,
que seja no ocaso de uma tarde de verão
porque eu caminharei sem pressa
apreciando a minha sombra
as minhas mãos.

Horas

amanheceu e eu dormia

esquecida de que havia dor

e amor

não era tarde, apenas dia

eu sonhava com a primavera

meu pés atravessando um longo inverno

passaram os ponteiros

passou o cais

perdi a hora,

o navio das horas.

despertai que a é vida breve

e os sinos tocam!

(Beija) Flor

Na madrugada procurou-me um beija-flor
a mim, que sou flor do campo num vaso da cidade
Beijou-me as pétalas com seu hálito de eternidade
bailamos juntos
trocamos nossas seivas,
nossos segredos
Antes que o sol raiasse, adormecemos:
eu um beija-flor por todo caule
ele uma flor em cada asa.
Suaves e unidos naquela cama da nossa casa.

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Versos

Umas coisas eu tenho e escondo
medo e lágrimas
Outras eu possuo e revelo
fé e amor
Ora me lanço
ora me ouço
Na hora das estrelas suspiro
com saudades do dia.
Vede em meus olhos
as cores todas sorrindo
enquanto escrevo versos em guardanapos.

Atitude

Se não sabe do que se trata
não opine
não se meta
não critique.
Melhor a boca fechada
do que um coração ferido.

Confissão

Era tanto amor...
encontrei teus olhos:
quis baldear meu coração
para tua vida.
Mãos em concha
alma em brasa
flori minha sementes
plantando meus sorrisos em tua boca.

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Momentâneo

os suspiros enchiam-lhe os olhos de lágrimas
o som da tristeza estava espalhado por suas mãos
não contavam o que tinha sido
lamentavam apenas o intocável
como o ocaso no horizonte
lindo e intransponível.

aprendera fiando pensamentos
a transpor pontes e dores.

sendo forte como um caniço varrido pelo vento
envergara-se por uns momentos
sentindo nos seus pulsos o raiar do sol

matéria resoluta
renascida das cinzas do fogo que mesmo ateara
cingira ao redor de si o projeto de ser feliz.

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Espera

Queima em mim

todo brilho

toda luz

toda estrela 

que brilha no céu de minha boca

Sou seixo pequeno

sou seios fartos

amores plenos

cartas com segredos declarados

Ardem fogueiras na pele

nestas noites de saudade

Sou raiz, árvore

história de vida inteira

Oração, prece.

Deitada no chão frio

raízes, palavras,

leito, descanso.

Meu coração faz promessas

de não sofrer

enquanto imagina ouvir a porta se abrir.

Assunto

Se me perguntam sobre o amor

respondo feliz:

é só disso que sei falar

Fecho os olhos

suspiro e sinto

correr em mim

e no vento

o inolvidável almíscar

do sol nas cercas e nas flores.

Um amor universal

entranhado no corpo inteiro.

Minha boca só fala do que foi feita.

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Cheiro de céu

Cheiro de céu
quando estou nos teus braços.
Segura as minhas mãos
vamos
vamos devagar
vamos rapidamente.
A felicidade palpita em meu coração.

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Hieroglifando

a moça na praça
olhando o tempo passar
(o tempo não passa)

suas mãos fiando as horas
seus olhos espiando o céu
desenho de renda no colo
cabeça de sonhos na lua

era menina na hora tardia
tornou-se mulher
pela força do dia

segredos sabia
receitas de luz e de cor

a moça sentada no banco
os livros gravados nos dedos
os pés hieroglifando caminhos

indecifrável sua face
sulcada de vento e de areia.

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Projeto

Engendrei mil planos
Desenhei no papel e na cabeça
Mentalizei o fim
Quase consegui...

Traidor, o meu coração
desmancha o pacote
e o laço.

Sorriso e abraço
letrinhas até num papel de pão
qualquer sinal de fumaça
- olhinhos de vidraça -
brilhando todo dia.

Eu preciso

é preciso aprender a ser triste
a sentir a dor da partida
a saber da finitude das coisas
e continuar trilhando o caminho

é preciso aceitar outros pensamentos
outros movimentos
outros tempos, outras línguas
outros olhos que enxergam além de si

é preciso ser o mesmo
que gira mimético na brincadeira de estátua
e roda lento no carrossel do tempo
e parte silenciosamente no meio dos trovões

é preciso compreender
o indecifrável do amor.
inventar signos que traduzam
o cheiro da saudade numa cama vazia.

eu preciso.

Atenção

Eu queria uma palavrinha
seis letras apenas
para encher meu coração de alegria:
atenção.

um aperto de mão
uma ligação
boa noite e eu te amo
(tudo isso cabe nas letrinhas).

de esperar quem sabe eu canse
quando no lugar da espera
cresça um calo.

Saudades sem fim

A poesia veio do espinho
encravado nos olhos cheios de boa vontade
Derramou-se por aqueles vazios
uma vontade imensa de ser feliz.

Não importou se doeu
se sangrou
a primavera perfumava os jasmins nas janelas.

Aqueles olhos cheios de notas de viola
e de saudades sem fim
viam dores
mas eram as flores
seu alento e esperança.

Segredos

os olhos cheios de palavras
derramavam-se no fim da tarde
miravam as crianças no parque
e o apaixonado encontro do dia com a noite.

naquela penumbra
havia cheiro de jasmim e de pipoca
nos canteiros as formigas preparavam-se para se recolher

infinitas as vontades que a invadiam
mas seus olhos misteriosos e cheios de palavras
contavam segredos apenas entre si.

Fugaz

De repente, dia
Novamente, noite

A antropofagia do tempo
nos olhos do homem.

Nem passado, nem futuro
só o presente desenhado na areia fina
- o vento insiste em desmanchá-lo.

Fugaz
o dia
a noite

Fugidio
o tempo.

Era eu

O cheiro da noite estava na cama
Lá fora, na rua, era lua crescente
Cá dentro era um peito cheio de saudade e poesia

Minha alma cantando debruçada na janela
uma cantiga de amor que ia pela estrada.

Escuro o céu,
claros os olhos que fitavam estrelas.

Aquela mulher,
que era eu,
trazia uma flor e todo amor.

Felicidade

Eu me fiz uma promessa
olhando as pequenas rugas ao redor dos meus olhos:
ser feliz.

E quando não estou alegre,
miro o espelho e sigo.

Alegria é apenas o sorriso da felicidade.

Saudade e poesia

Saudade é a poesia do que falta
nos que ficam a ver antigos filmes
projetados em suas retinas.

De amores lindos

Eu juro, sim,
engoli uma bandinha da lua
e de lá,
onde ela se alojou,
saem borbulhas de amor
-essas que vagueiam na praça.

Quando é cheia, a lua
é repleto meu coração.

Amores lindos.

Solidão

Na estante o retrato mudo.
Resgato-o no meu colo
sinto o perfume e a maciez dos cabelos recém lavados 
a mesma urgência de viver
como agora.

Era necessário mais tempo, mais paciência,
mais contemplação, mais espera,
menos urgência, menos desatino.

Agora eram horas idas
o retrato com tanto amor impresso
eu sozinha nesse sofá
escrevendo para mim mesma.

Juntos

Abissal.
Seus olhos me olham e eu mergulho
de corpo e alma
nos seus abismos.
Não quero resgate
- cada vez mais fundo
segurando a minha mão.

Coração passarinho

Ouço laços e nós se apertando
perduram infantis
são moços e leves como borboletas.
Ao redor dos vasos, luz.
Toda tristeza é vã.

Coração passarinho
alegria de amanhecer cantando
sem antecipar a aurora.

Germinação

Olhos sôfregos espreitando a vidraça:
o que havia fora
era muito mais forte dentro.
A respiração entrecortada e ansiosa
dizia da espera,
tempo guardado naquela semente.

Germinação de amores
dentro daquelas cacimbas profundas
(tragam flanelas para limpar as janelas!)

Gula de amor

Mais que encontrar o amor
eu sempre quis me lambuzar
Gula de amor seria pecado?

Mulher e mãe

Vindo de longe, sem saber de onde vinha
Caminhava como rainha
e em seu coração havia a centelha do amor
Por isso, então, decidiu partir sem destino outro
que não fosse estrada de encontro.
Tornou-se mulher e mãe
sedimentou seixos e plantou flores.
Dos seus olhos sempre partiam e findavam
os caminhos para o céu.

Pequena oração

As mãos postas em oração
As mãos dispostas em doação
Os olhos esparramados na escuridão
vendo coisas que somente entende o coração.

Jesus todo misericórdia e luz
sentado à mesa e no sofá
escuta-me as orações
incentiva minhas doações
faz silenciosa a noite e brilhante as estrelas
para que eu enxergue.

Caixinha

Cingi meus pensamentos naqueles olhos
- partiram, levando-os.
De repente dei-me conta de que não adiantava ficar
porque tudo de mim havia ido.
Era eu invólucro de amor - para sempre.

Revelações

Com os olhinhos brilhando, ela perguntou:

- somos estrelas?

E foram, mãos dadas, pela beirinha do céu.

Pergunta sem resposta.

Iam brilhando, etéreas e silenciosas.