quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Absurdo?

Absurdo?
Entregar-me sem reservas
Cair, ralar o joelho, quebrar a cara
Acreditar na bondade da pessoa que me encara com uma faca na mão,
Com uma mentira nos lábios,
Com o meu coração no bolso.
Não sei me desfazer diante de outros
Verter minhas lágrimas ao sol.
A palavra dura e seca que custo a proferir
Caleja minha garganta sedenta de verdades.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Quase dezembro

Antes que termine o mês de novembro vou derramar minhas letras nesta tela. Pensamentos e palavras. Atos e omissões. Estes últimos termos, sabem-nos os católicos - proferimo-os no ato penitencial, na missa.

Quando passo muito tempo sem escrever sinto dificuldade em coordenar minhas ideias. Não pela falta de treino, mas pelo atropelo das muitas coisas que transitam na minha mente.

A primeira coisa de que me lembro agora é um pedido de desculpas. Generalizado. Por ser quem sou, por ter feito ou não o bem, por silenciar, por falar demais. Por ser quem sou e ter magoado ou não ter amado o suficiente, por não ter sabido ouvir ou ver. Pelas minhas ausências, por não ter ligado ou visitado com maior frequência, por não saber partilhar das minhas dores e preocupações. Peço desculpas.

Depois lembro de flores. Sempre elas. Tempos atrás havia na minha casa arranjos artificiais. Dois vasos. Hoje não existem mais. Aos sábados minha mãe me compra flores na feira. Fico feliz ao recebê-las e mais contente ao vê-las amarelas - crisântemos, ou alaranjadas - sempre-vivas. Qualquer variedade me conecta a grandeza de um Deus singelo e cuidadoso. Ganhei de seu João, o homem que vende mudas na feira, um pezinho de angélica. Brota silenciosa haste de florezinhas brancas e excessivamente perfumadas. Saem do meu jardim para minha sala.

Agora recordo-me que domingo pensei em escrever sobre o ano novo. O evangelho de São Marcos (13,33-37) dizia: Vigiem e fiquem alertas, pois vocês não sabem quando chegará a hora. E essa hora é o tempo da colheita e devemos cuidar para estarmos maduros e disponíveis para o Senhor. No calendário litúrgico já estamos no novo ano e aguardamos a 'chegada do Messias'. Nesta rememoração posso sentir a inquietação maternal de Maria - aquietada pelo calor do corpinho santo do seu Filho em seus braços.

Padre Airton Freire canta uma musiquinha que diz assim: "É Natal novamente, festa do menino luz. Tornou-se um como a gente, nasceu o menino Jesus. Sua mãe era judia, tinha por nome Maria, seu pai era um carpinteiro, José, seu nome primeiro. Os seus não O receberam, deram-lhe morte de cruz. Vive no meio de nós, Divino Menino Jesus!". Nos meus silêncios ouço esses versos. O tempo do Advento causa-me espera feliz. Conheço pessoas que se sentem tristonhas por essa época - para elas minhas orações.

Desculpas. Flores. Novo tempo. Natal. Coisas correlatas? Para mim, sim. Ando preparando a manjedoura para o Menino Luz.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Tem dia que a gente acorda e a saudade dá bom-dia



Cheiro de terra molhada, de café bem cedinho e lavanda no cabelo.
Melodia de cantigas de roda, panelinhas de barro, fogão de carvão, pedaço de gesso para riscar o chão.
Livros, lápis de cor, farda e sapatos novos.
O silêncio dos olhos do meu avô.
Fox, o cachorro perdigueiro que mastigava as roupas da minha infância.
Tem dia que lembro dos antigos abraços, das partilhas secretas de palavras às vezes nem ditas, dos cheiros dos natais e seus jambos e siriguelas, das risadas emaranhadas nos bancos escolares, das lágrimas imaturas de quem não sabe lidar com a vida.
Tem noites que olho para a lua, a mesma de outrora, mas agora ela me lembra que o tempo passou e levou a minha boneca, o meu chinelo 'japonês ', o encontro diário com os amigos.
E não posso voltar. E não podemos voltar.
E a vida nos leva em frente e não considera o passo atrás, e não ouve nosso soluçar de criança, e não pondera a perda, nem o ganho.
Já não somos infantes, mas quem esqueceu de nos informar de que crescemos?
Tem dia que a gente acorda e a saudade dá bom-dia.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

No mesmo frasco

Tudo junto e separado - por estar no mesmo frasco
Tudo simples e complicado - no amor guardado em meus olhos
Tudo aqui e agora - na ausência das sublimações fictícias
O que digo, o que penso
Interesses só meus?
Onde estão nossos hífens
Nossas vidas costuradas com linha sessenta?
Tudo junto e separado - por estar no mesmo frasco.



segunda-feira, 7 de novembro de 2011

(Foto)Síntese



Minhas palavras, antes de escrevê-las, são suas
Assim como eu e o meu amor
E até parte de mim que não sei onde fica
- como a luz pertence ao dia.
Amealhando as horas costuro na barra da noite
A esperança de rever seus olhos
Fotossíntese das minhas vontades e desejos.
Seus beijos, seus beijos
Sou aurora quando lhe vejo
E fina textura de vento nos cabelos quando vai embora.
Como saudade, como verso de beija-flor ao bater as asas
Como as pedrinhas deixadas no caminho
Como sussurro que não se fez palavra
Como a vontade que não se fez verdade.
Antes de amar seu corpo com minhas mãos
Antes de desenhar meu amor com minhas letras
A saudade faz antever suas formas
Em mim, no meu caderno, no meu travesseiro
Na noite que antecede o dia em que sinto sua respiração.