sexta-feira, 27 de maio de 2011

Palavras ao vento.

Ouçam-me. Grito-vos aqui deste sofá.
Falo dos amores e injúrias
Das saudades esparramadas por sob a sombra das árvores.
Desenho letras miudinhas para falar de grandes hiatos
Breves tormentas, floridas primaveras entre as pedras.
Silencio meus batimentos cardíacos
Devo ouvir-vos, mas é tarde
O sono já vos carregou e dormis entre lençóis e sonhos.
Palavras ao vento... ao vento... e ele faz a curva
Volta-me sutil em pensamentos.
Ouço-me. Circulação.
É tarde. Desejo falar-vos ao pé do ouvido
Mas seriam muitas passadas em direção ao mar
Tão longe... tão distante.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Erva de espinho

Eu vejo coisas que todo mundo vê. Vejo coisas que não quero.
Há coisas que são inacreditáveis, como plantar uma flor e colher erva de espinho.
Em certos momentos não versejo porque as palavras estão machucadas
Espero do outro mais do que pode me dá?
Quase sempre.
Tenho medo do escuro. Não do que vê meus olhos.
A negra escuridão dos caminhos em que não encontro mãos
Nem ouço os breves suspiros das almas por mim veladas
Eu sinto coisas que não sei explicar
Sei de coisas que não ouso falar - e elas engolfam minha respiração.
É noite agora. E já era antes.
Lembro do conselho de outrora
Tenho que saber que tudo é estação
Já, já vou poetizar meus vazios outrora repletos de dúvidas e anseios.

sábado, 21 de maio de 2011

Ponto final

As coisas são como elas são?
Sim e não.
Dentro de mim grande proporção de tempos em tempos.
Eu não conheço os detalhes
Eu finjo que sou importante
- pacto com sorrisos e mensagens escondidas nos meus próprios olhos.
Tudo é muito pouco
Fingindo que sei do curso da vida parece que o horizonte revela-se conhecido.
Eu não sei, muitas vezes, nem do que seria obrigatório eu saber.
Quero que me mostrem, que me dêem a mão.
Meu querer não é poder.
Ponto final.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Só Ele é e basta



Eu me esqueço, às vezes. Sinto medo, sinto-me pequena e incapaz.
Eu me esqueço que só Ele é e basta.
Esqueço que sou filha de um Deus vivo, latente, latejante, presente na minha respiração.
Ele respira quando eu respiro!
E eu esqueço de dividir, de derramar-me no seu colo, esqueço da sua misericórdia.
Esqueço que só Ele é e basta.
Deixo-me esquecida na escuridão das perturbações diárias, abandono-me em mim
Esqueço do caminho do Pai
Esqueço da cruz e da ressurreição.
Esqueço da beleza posta para mim
Esqueço que só Ele é e basta.
Há os que me recordam de tudo quanto esqueço.
Há minha menina interna, pequenina e confiante.
Há os afagos filiais do fim da noite
Há a lua a me fitar no retorno do trabalho
Há minhas roseiras no quintal
Há meus amigos
Há o amor que escolhi para mim
Eu esqueço Dele
Ele não. Ele me manda recados.
Só Ele é e basta.

Assista e escute (na voz de Padre Airton Freire)
Nada perturbe o teu coração
nada te espante, não!
Pois tudo passará
só Deus não passará!
Só Ele ficará
Ele não passará!
A paciência tudo alcança
Quem a Deus tem
Nada faltará!
Fora de Deus tudo é vão.
Só Ele é e basta!

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Com fiança. Confiança.

Confiança é o ato de deixar de analisar se um fato é ou não verdadeiro,
 entregando essa análise à fonte de onde provém a informação e simplesmente considerando-a. http://pt.wikipedia.org/wiki/Confian%C3%A7a(Wikipedia)

Escutei muitas vezes que recuperar a confiança perdida era difícil. Não sei se alguém desacreditou de mim, se permaneci desacreditada. Sei bem que a afirmação da primeira frase é muito verdadeira.

Uma criança que se deixa lançar ao alto, sorrindo e fazendo algazarra. Imagem da confiança, de entrega. Ela se abandona, se delicia em aguardar as mãos que a jogaram para cima segurá-la e lançá-la novamente.

O que nos direciona em escolher um amigo, um banco para depositar as economias, um médico? Confiança. O que nos dá suporte num relacionamento? Confiança.

O ato de deixar de analisar. Eu escuto o que o outro me diz e acredito. Não duvido da história, da situação, dos detalhes mais estranhos - porque eu confio.

Com fiança. Assim separado. Confiança. Crer, apostar no outro, mergulhar de olhos fechados.




domingo, 15 de maio de 2011

Água perfumada

Nos meus desertos não estou só
São desertos que me despertam
Há plantas de espinho, grande extensão de terra árida
E bem no centro, palpitando, borbulha água brotada de uma flor singela.
É difícil e estranho
E nesse lugar só adentram eu e outro pedaço de mim
- que só se revela em dias de muito sol ou muita chuva.
Nos meus desertos
Nada há por certo
Decerto não sei rimar
- desculpem-me a falta de métrica -
É que me sobram idéias e me fogem as palavras.
Por debaixo daquela ponte corre o rio vindo da flor
Água perfumada, com cheiro de angélica de final de tarde.
Derramo-me por onde passo.

Endereço da imagem


terça-feira, 10 de maio de 2011

Calabouço


Se tu me amas, ama-me baixinho
Não o grites de cima dos telhados
Deixa em paz os passarinhos
Deixa em paz a mim!
Se me queres,
enfim,
tem de ser bem devagarinho, Amada,
que a vida é breve, e o amor mais breve ainda...
Mário Quintana


Todos os meus amores,
Todos de que me recordo,
De nenhum fiz estardalhaço
Nada mais que abraços, gentilezas e entrega
Sem carros com mensagens de paixão
Nem pintura nos muros
Apenas declarações em folhas de caderno,
Em palavras sussurradas - ora cantadas em canções de ninar.
Para os meus amores entrego-me com reservas
Esperando que as resgatem.
Silenciosamente, de mansinho,
os meus amores me fizeram fortaleza,
calabouço, monstro devorador.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Aquele momento

"Sempre tenho a estranha sensação, embora tudo tenha mudado
 e eu esteja muito bem agora, de que este dia ainda continua o mesmo,
 como um relógio enguiçado preso no mesmo momento – aquele."
Clarice Lispector


Eu também, Clarice. Sou a mesma e sou outra. E a outra insiste em recordar-me a mesma.


Passos à frente nem sempre significam avanço. Passos largos e apressados às vezes nos levam para tão distante de nosso objetivo que voltar é um exercício sofrido e descrente. Abrir a porta, abrir a boca, abrir a alma. Tudo mudado mas ainda sou eu aqui.


Os versos tristes são os melhores? Não, não são. Eles revelam nas letras estranhas ao nosso pulso as nossas entranhas. Derramamo-nos nas suas entrelinhas - no anonimato. A tristeza é sentimento que escondemos porque, sendo o inverso da alegria, é o nosso avesso machucado, acabrunhado. Um sorriso triste, quem detecta? Aqueles a quem tentamos ludibriar: os que nos vêem e nos amam.


Nessa dicotomia existente entre ser  e tornar-se há o momento decisivo, aquele ao qual voltamos - mesmo sem querer. O momento da mudança, da metamorfose, da revelação, da ruptura, do reatamento.


Em nós, ainda que mudemos, para pior ou para melhor, coexistem, não sem conflitos, os valores e os amores de antes, de agora. É como, desculpem a comparação pueril, adotar um filhotinho de cachorro para substituir o outro, que agora morto, foi seu melhor amigo. No mesmo quintal habitará o amor saltitante e o amor de saudade. E embora a felicidade esquente suas mãos com calorosas lambidas, a saudade queimará seus olhos ao encontrar apenas o filhotinho.


Quem acha vive se perdendo, já cantava Noel Rosa e me repete com frequência querido amigo. Por isso achando que meu relógio enguiça inúmeras vezes ao longo tempo, vou me perdendo em achar. Tem nada não... Perdendo vou encontrando e reencontrando e criando. Vou achando que apesar do relógio é bom viver!

terça-feira, 3 de maio de 2011

Além-mim

Camisa de algodão - listras brancas e azuis, calça jeans, tênis e meia. Estou vestida. Minhas partes que não devem se revelar, cobertas. Minhas partes que se mostram, confortáveis. A vida podia ser simples assim, mas definitivamente não é.

Acordar já é ato de escolha. Acordar, ajustar o desejo das partes. Há coisas que não se ajustam, não produzem nem sombra - que depende basicamente do outro. Pau que não dá sombra. Por que você o escolhe? Madeira que abastece a fornalha não é madeira de construção. Depois que o pedreiro senta as pedras do terraço de forma irregular, confiará você que na sua sala de estar se dê melhor trabalho?

Nova chance. Confiança. O vidro quebrado é substituído e não remendado. Na vida, não dá para ser assim. Ficamos olhando pela vidraça trincada, focalizando a paisagem, vendo além da rachadura.

O caminho é passagem, é tropeço, é recomeço. É dali para frente (ou para trás). O caminho é pergaminho de passadas. É isso. O caminho é a história de agora. É a história de além-mim. É a história, às vezes, do que já teve fim.

Conforto-me lembrando da minha camisola macia e velhinha, com cheirinho de roupa limpa na gaveta. Visto-me no meu ninho. Não acho pouso, minhas asas teimam em voar. Vou indo. Vou caminhar no aceiro que abri agora.

Tudo poderia ser simples. Mas não é. Complexa. Completa. Repleta. É a vida. E eu quero vestir a minha camisa de algodão, o meu vestido de minúsculas florezinhas e compreender, só um pouco, do complexo da vida.

domingo, 1 de maio de 2011

Pé de mim

O tempo mudou. Aquelas nuvens do horizonte estão sobre nossas cabeças. E chove. E a água não escoa, e os esgotos não a comportam. Há muito mais silêncio do que trovões e relâmpagos que insistem em iluminar o que está escuro.

Em mim paisagens. Passagens que teimam em retornar e não me deixar. Sensação de pés úmidos, que detesto. Sigo para o primeiro abrigo, quero enxugá-los, mas me dão uma toalha também molhada. Será que há uma conspiração? Respiro fundo, engulo seco, faço o melhor - acreditem - o meu melhor.

O meu melhor não é suficiente. E sigo em frente, sempre em frente. Ao meu lado há companhia. Dentro de mim há companhia. Desculpem-me a ausência, os olhos postos além, meu eu esmaecido em gotas derramadas, em enxurradas que não me arrastam. Eu sou essa. Sou também aquela, deslumbrada, com um lindo céu de verão. 

Estações que passam: invernos de alma, verões de alma - na mesma alma. Passam por mim e me mudam e bem na sua frente troco de roupa, de tino. Desatino, quase sempre. Em minha face há jardins - e são eles que deixo o outro ver. O céu gris reservo para aqueles que conhecem os canteiros em que plantei minhas flores, minhas ervas, meu pé de mim.