quarta-feira, 27 de abril de 2011

Entregar-se sem duvidar - é fé.
Acreditar no que não se vê, esperar confiante.
A minha crença são muitas. Creio num Deus Trino, na ressurreição, na misericórdia do Cristo que veio para me salvar, me resgatar. Há um grande mistério em viver e às vezes, pensando nisso, sinto sobremaneira a minha pequenez e ao mesmo tempo é como se minha alma, lançada no universo, pudesse alcançar tão alto nível que, ainda sendo minha, não me pertence.
Eu tenho fé na boa vontade das pessoas. Creio que serão sinceras, verdadeiras. Anseio por encontrar nelas o que há de melhor, ainda que tropece em seus pés deliberadamente postos a minha frente. Ainda que me enganem, sofro por procurar-lhes motivo ou justificação.
Estamos rememorando a Páscoa, recordando a graça do resgate, a possibilidade de ressurgirmos de nós mesmos, de sairmos do sepulcro. A ressurreição, assim como o amor do Pai Criador, é todo dia. Deixar morrer o velho e aflorar novo ser. Também creio nisso, com fé inabalável.
As dúvidas da minha fé? Servem para empurrar-me sempre à frente. Sei que Ele estará lá, como está aqui agora. Minha exitação não muda em nada o eterno.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Amargura

A amargura é sempre ruim?
De pronto podemos responder que sim. É dor macia que fica por cima do respirar. Visguenta, sufocante e ajuda a emagrecer - porque nos enche o estômago e é de difícil digestão.
Pessoas amarguradas, aquelas de natureza sofrida, por opção ou imposição, andam diferente, se portam diferente, há um que de lâmpada apagada até no sorriso mais feliz e improvável. Nelas, o que surpreende é a fugaz alegria.
O contrário ocorre com o indivíduo que é feliz ao acordar, ao tropeçar, ao cantar, ao vender uma rifa, ao visitar um enfermo no hospital. Sua leveza preenche o ambiente, antagonicamente. Seus olhos enxergam beleza no céu gris, na folha seca, consolam - de soslaio - a solidão nada poética do dia-a-dia.
Amargura só no chá de carqueja, na semente de macela. Amargura medicinal. Amargura boa!

Úmidas

Poucas palavras ditas
Muitas em minhas mãos.
Não querem ser ouvidas
E calam-se, úmidas, nos meus olhos.
A dureza unilateral
A espera lancinante
Por seu singelo sim.
Escondida ou revelada?
Vem em meu auxílio a madrugada
Cansada e sonolenta.
entrego meu corpo ao abandono
Das letras não ditas, não escritas
Escorridas apenas na quentura do meu pensamento.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Papel-manteiga


O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. 




Tem certos dias que não são certos. Nessas horas de desacerto o dia parece mais longo, o céu mais escuro, a noite mais silenciosa e o relógio da cozinha parece possuir um grande amplificador. Tic-tac. Tic-tac. O pensamento é o mesmo, ritmado pelo tiquetaquear, de que não há possibilidade de respirar sem doer.


Perspectiva e expectativa. Parecidas, parentes, mas não se dão bem e em mim não andam juntas. Aquela como vejo, a outra como espero. Ao se encontrarem revelam o que já havia - eu só não ouvia.


Abstração. Distração. As letras, os números, as fotos, as flores, o que mais amo.


As dúvidas e incertezas. As alegrias, a pureza. Os olhos fitos no caminho. O caminho reto ora perdido. A árvore da curva revelada. Tudo e muito mais embalado no papel-manteiga que usei para desenhar o amor. Suas arestas cuidaram de rasgar-lhe o delicado invólucro.


Não adianta. Lá onde o vento sopra, dentro do meu peito, há um pé de folhas grandes e raízes profundas. Nos dias de alegria ouço-as dizer que passará. Nas breves tormentas obrigo-as a vociferar que vai passar. E vamos nesse canibalismo de sentimentos - eu a engolir o amor, o amor a engolir-me sempre.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Alquimia


Talvez a clareza das palavras
Vencesse a dureza das coisas
Mas é vão o desejo
E no vazio dos pensamentos se perdem,
iluminadas idéias.
Antes de ser a revelação,
Moenda de sentimentos,
A poesia tosca e diária dos meus dedos
Não é capaz de ser mais do que leitura
Nesse caso.
A alquimia dessa água corrente
-não conheço.
Desço rio abaixo
a procura de remanso límpido
que acalme o não saber turvo de minhas águas
-já navegadas.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

O filho pródigo


Já meditei muitas vezes este trecho do Evangelho de São Lucas (15,11-32). O filho pródigo: sua partida em direção ao mundo, sem pensar no sofrimento que aquela decisão causaria em seu pai, sua crença de que partindo para longe teria a bênção de uma vida feliz (amigos, diversão, dinheiro, reconhecimento...).

Ontem, na reunião de pais e mestres do Colégio Imaculada, apresentou-se para palestrar o senhor Hamilton, da Comunidade Boa Nova. Falou-nos da dificuldade de educar os filhos, de mostrar-lhes limites. Partilhou um pouco de si, da sua família, da sua história e apresentou-me nova maneira de ver a velha palavra. A Bíblia  é antiga e tão nova (parafraseando Santo Agostinho, ao falar de Jesus - beleza antiga e tão nova!).

Começou por perguntar-nos qual de nós teria dado a parte da herança, pedida pelo filho. Frisou que o pai dera o que o filho pedira pois vislumbrara naquele instante que não poderia demovê-lo da sua idéia. O filho solicitara a sua parte pois o que queria fazer, sabia, não era seu pai de acordo, não poderia ele concretizar seus planos naquele lar. Era necessário pois que partisse para longe dos olhos amorosos de seu pai.

Vai. Gasta seu dinheiro, descobre os falsos amigos, os amores especiais e fugazes. Entrega seu corpo, sua mente, seus recursos, passa fome e sede. Sofre seu corpo e sua alma. Pensa no amor paterno (Deus é misericordioso). Decide voltar, pedir perdão, se humilhar.

Em seu retorno, reconhece-o, de longe, seu velho pai. Corre em seu encontro. Manda que lhe tragam roupas, sandálias, anel - que matem um gordo novilho. É festa! Volta a vida o que estava morto.

O filho mais velho retorna da lida. Ouve de longe o barulho da festa e pergunta ao servo: o que há na casa do meu pai? Seu irmão regressou e seu pai comemora. Sem compreender além do que vê, recusa-se a entrar. Seu pai vem ao seu encontro, ratifica que é dele tudo que lhe pertence, que sabe da sua fidelidade e dedicação.

O filho mais velho fica do lado de fora porque sabe que não há tolerância naquele lar para irmãos que não se respeitam, não se amam, não sabem perdoar. O cerne da leitura, naquele momento, ficou sendo o limite e o respeito. Ambos os filhos sabiam que naquela casa deveria haver respeito pelos valores ensinados pelo pai.

Sai do colégio pensando sobre tudo aquilo. E ainda estou.

A letra abaixo é de uma música que fala sobre essa passagem do Evangelho. Escute.

Acesse esse link:
Muito alegre eu te pedi o que era meu
Parti, num sonho tão normal. 
Dissipei meus bens e o coração também
No fim meu mundo era irreal.
Confiei no Teu amor e voltei
Sim aqui é meu lugar
Eu gastei teus bens, ó pai e te dou este pranto em minhas mãos.
Mil amigos conheci disseram adeus
Caiu a solidão em mim
Um patrão cruel levou-me a refletir
Meu pai, não trata um servo assim.
Confiei no Teu amor e voltei
Sim aqui é meu lugar
Eu gastei teus bens, ó pai e te dou este pranto em minhas mãos. 
Nem deixaste-me falar da ingratidão
Morreu, no abraço, o mal que eu fiz
Festa, roupa nova, anel, sandália aos pés
Voltei a vida, sou feliz.
Confiei no Teu amor e voltei
Sim aqui é meu lugar
Eu gastei teus bens, ó pai e te dou este pranto em minhas mãos. 

Arrebol

Passa o tempo,
Passa a vontade,
Passa a lágrima,
Passa o riso.
Ficam as marcas
Estações:
A folha que cai faz parte da árvore, sempre.
É folha  - dependurada
É folha - desprendida do galho
É folha - escondida na promessa
É árvore, quando, no chão misturada à terra, alimenta as raízes.
Passa a dor
Cai a flor
Passa o vento nos meus cabelos
Leva passado a passear.
Passa o tempo?
Ele não passa, quem passa é nossa breve existência.
No horizonte estou indo
Hipnótica esperança no arrebol
Vem a noite
Mas a partida do sol já não antevê sua volta?

terça-feira, 5 de abril de 2011

Calcinado

"O esperado nos mantém fortes, firmes e em pé.
 O inesperado nos torna frágeis e propõe recomeços."
Machado de Assis


Agora sei o que antes não sabia
E vejo o que estava encoberto
No horizonte há pegadas de regresso
Não são minhas, não são tuas
Há de ser do desafeto errante do meu coração calcinado
Pelo fogo da vida.
O caminho reto...
Nas curvas é que me perdi
No corredor escolhi entre as muitas portas
Vã poesia. Vãs palavras. Vã filosofia.
Não será vã a minha passagem?
Não será vã a minha passagem!
Eu não comprei a passagem...
Relembro teus lindos olhos postos em mim.
Não sei o que viam
Mas era eu que estava ali.
Sempre.

Fênix

Nos meus velhos olhos de agora
Perpassam as imagens de ontem
Adicionada, subtraída, revelada e desconhecida.
À beira do abismo, para seguirmos em frente temos que caminhar para trás
A menos que no desfiladeiro encontrem-se as respostas
- não acho que estejam nas frechas das rochas.
Semisserrados meus punhos, meus passos
Ando em linha reta e me acompanham  tortuosos caminhos.
Não me entendem. Eu não me entendo.
Nesse segundo fugaz até creio ser poeta
Não é na poesia que podemos ser mais quando somos menos?
A brevidade desértica do ato
O espinho perpetuado nos fatos.
Em meu eu esquivo e silencioso
Jaz e ressurge a fênix de mim mesma. 

domingo, 3 de abril de 2011

O caminho de flores

Uma vez, quando eu era pequena, fui passear com meu pai. Não lembro para onde íamos, mas estávamos na BR 232, indo em direção ao sertão. Minha felicidade, toda expectativa de chegar para onde rumávamos, acabaram-se quando atropelamos um cabritinho. Paramos, meu pai desceu para ver o estrago. Eu, de joelhos, olhando pelo vidro de trás, vi o cabritinho ser removido, na esperança de que houvesse sido apenas uma leve batida...

O cabritinho ficou lá, no acostamento. Meu pai dizendo as palavras que acabaram com minha tarde: o bichinho não vai resistir. E o bichinho ficou lá, à margem. Na minha cabeça sua mãezinha estava no mato, espreitando, aguardando o momento de sair e socorrer seu filhote. Não ia adiantar - "o bichinho não vai resistir".

Sabedoria, sobrevivência. Pode-se nomear da forma mais conveniente, contudo o que fazemos é seguir em frente. Rodeados de tristeza, de agonia, com pesadas nuvens sufocantes dentro dos nossos pulmões. Ainda assim, com o mundo desmoronado, há um outro lugar, de onde viemos antes desse agora causticante, onde as pessoas riem, o céu está azul e convidativo à alegria, os seus amigos estão no trabalho e a pessoa que você ama toma café com bolo inglês (partilha da sua dor, mas não pode sorvê-la, anulá-la).

O mundo gira. É dia. É noite. Não adianta esconder a cabeça embaixo do cobertor. Amanhece ainda assim.

Tive que elaborar minha dor. Nessa construção esqueci para onde fomos. Lembro apenas que havia uma ponte entre mim e a alegria de ir, a expectativa de chegar. Sei que fui, mas não recordo da chegada, nem do retorno. Foi pontual aquele atropelamento. Hoje sei que quando as coisas do mundo me atropelam consigo estar viva, do outro lado da ponte. Não é fácil, nem indolor, mas é possível (re)criar minhas expectativas.

O caminho de flores. É nele que eu quero estar.


sexta-feira, 1 de abril de 2011

Sem autorização

Eu pensei que sabia, que conhecia.
Eu pensei que saber ou pressupor serviria.
Eu pensei que conhecendo, imaginaria.
Sou o ditado popular: todo penso é torto.
E momentaneamente ficam tortos os pensamentos
e os caminhos, e os saberes.
Sei que nada sei - desculpe a cópia sem autorização...