quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Cara de gente sem-vergonha

Passatempos. Cada um de nós temos uma forma de aliviar as tensões do dia a dia. A do meu pai é pescar. Pescar mesmo. Nada de ir tomar uma com os 'pariceiros', como diz a minha vó. Quem quiser ir com ele é para aguentar o sol na cuca, ficar no barco até à noite - sem enxergar um palmo além do nariz, fazer força para tirar e colocar o barco no reboque.

Mas não é só dureza. Tem o pirão de peixe fresco, de preferência de piranha graúda, e os passeios para as prainhas e as histórias (eu acho essa parte, junto com um sem fim de minutos boiando na água friazinha, a melhor).

Ele, meu pai, é caladão porém quando se espalha nos causos, a conversa é demorada.

Hoje ele veio jantar na minha casa: xerém com galinha e café preto. Cobrei meu peixe, reclamando que no supermercado só tem peixe congelado (não gosto!). Depois de justificar que nem tinha pescado no último final de semana, primeiro porque estava com o ouvido doendo e o sol estava de lascar o cano e depois porque à noite a ventania estava braba e que tinha desistido porque via a hora do barquinho virar, veio com uma das suas pérolas:
- da próxima vez que eu for para lá, vou levar veneno para matar a peste daqueles bodes!

Meu espírito, doutrinado por São Francisco de Assis, logo contestou:

- Oxente, painho, que invenção é essa?

- Pronto! São uns bichos danados! Pulam a cerca, entram em casa, derrubam tudo. Outro dia Aluízio (companheiro de pescaria) deixou um caldeirão de feijoada e a cabra entrou na cozinha e fez o maior sangangu (bagaceira, se você não conhece o termo)! A peste da cabra tinha a cara de gente sem-vergonha!

- Painho, quem já viu cabra ter cara de quem não presta?!?

- Deixa estar, respondeu, que quando eu for para lá, de novo, aquela cabra (contorcendo a cara, fazendo munganga de gente sem-vergonha) vai ver só uma coisa!

Meu pai, Izac Britto (Tutu)