quinta-feira, 3 de maio de 2012

Ela não acredita em destino

Ela penteava-se olhando sua imagem refletida no espelho matinal. Seus olhos abertos diziam que todo seu corpo ainda estava dormindo, mas era hora de sair. O mundo estava assobiando, chamando no portão.

Os livros, as anotações, a agenda. Óculos escuros. Horário da reunião. A pauta, as metas. Revisão mental. Gira a maçaneta e lembra que esqueceu de passar perfume. E batom. Na casa do outro lado da rua abre-se a porta. Bom dia! Como vai o senhor? (como é mesmo o nome dele? Hum... não consegue lembrar). Lembranças para sua esposa (também não sabe o nome dela!).

Céu de Brigadeiro. Os olhos de Deus estão azuis mas andam desejando que se enfureça e mude-os em cinza e se arrependa, e chore. Um calor de verão às vésperas do inverno. Se não fossem as bolsas do governo já haveria muita gente de matulão às costas.

As mãos estavam exauridas de tentativas e os olhos felizes com o resultado. As mudas em breve seriam plantas. Os brotos - nascituros. Ela pensava nos direitos das árvores e nos seus deveres: a segunda parte estava cumprida - sombra espraiada na calçada inteira.

Foi cumprir o seu destino. Ela não acredita em destino. Foi, pé no acelerador, ao encontro da sua escolha. Desandou a matutar. O cheiro de café despertou seus instintos de gourmet, mas estava açucarado. Um pouco d'água. Pronto. E passou-se um dia inteiro.

Ela despenteava-se fitando as finas linhas emolduradas no espelho. Sorri e há vincos em sua face. Não se importa. Seu tio lhe dizia: quem não quer ficar velho, morre novo. Seus olhos devem descansar mas sua alma manifesta o desejo de dançar nas páginas em branco.

Ela é a imagem do espelho e a alma das finas linhas. E quer ficar velha.

Imagem de Zazzle