quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Panças, papos e piadinhas

É melhor ser alegre que ser triste
Alegria é a melhor coisa que existe
É assim como a luz no coração
Vinícius de Moraes, Samba da bênção

Muito riso é sinal de pouco siso. Escutei muitas, muitas vezes essas palavras.
Na minha infância e adolescência era bastante uma formiga sair um pouco do caminho. Isso já era motivo para um comentário e muito riso. E por falar em formigas, destinei um bocadinho das minhas horas em observá-las. Aquela longa fileira, umas indo e outras voltando, se cumprimentando, carregando bolo, açúcar, arroz, folha. Por vezes uma levava a outra. Ficava imaginando se era para 'enterrar' ou para se alimentar.

Uma vez por mês as mulheres de onde trabalho se reúnem para exercitar a camaradagem. Oportunidade em que aproveitamos para encher as nossas panças de guloseimas, colocar os papos em dia, contar umas piadinhas entre uma xícara de café e um copo de refrigerante e rir muito. Se pudéssemos nos reunir toda semana... Saio com muito mais calorias do que chego, em compensação meu espírito sai leve, recompensado por aquela partilha.

Muito riso é sinal de pouco siso. Ditado mais besta. Fazer mangação é bom demais. Não é com maldade, nem para ridicularizar ninguém. É a cumplicidade de criança aflorada naquele momento. Rir porque o colega tropeçou e quase caiu. Porque a amiga perdeu um dente e enquanto o dentista não socorre ela fica falando como chinês, com a mão na boca. Completar uma ligação discando o número do telefone no teclado do microcomputador? Tem coisa que não dá para passar em branco. Tem que passar é com muita cor.

A primeira coisa que esquecemos quando sofremos é da cor. Nossos olhos acham mais fácil vestir aquela roupa escura, sem detalhes. O detalhe é colorido. A vida é o detalhe.

Já recebi um zilhão de vezes um e-mail cujo texto é atribuído a Arnaldo Jabor sobre a seriedade das pessoas. O texto fala da chatice de gente que não tem jogo de cintura, que de tudo faz um cavalo-de-tróia.

Tem coisa mais deprimente do que conversar com uma criatura que é a urucubaca em pessoa? Tudo está ruim, o sol está muito quente, o vento está muito frio, a comida muito salgada, a água está morna, a roupa está velha, o sapato apertado, o trabalho é maçante, o amigo está irritante. Afe! Repito o mote que um tempo desses todo mundo repetia por conta de uma personagem de uma novela da Globo: é a treva!

Costumo dizer, às vezes, ao contar uma história "aí, eu rinchei bem muito". Rinchar é sinônimo para relinchar. E não, eu não me torno um cavalo ou uma égua. É que aquela risada bem alta e gostosa de algumas pessoas lembra o conversado desses animais: dentes de fora e muito barulho.

Gente que sorri não é enfezada. E enfezada é retrato de uma pessoa de mal com a vida, ao pé da letra é uma pessoa cheia de fezes. E vamos concordar: prisão de ventre também 'é a treva'...

Assim, vamos exercitar o sorriso e a gargalhada. Pode deixar marcas de expressão, porém acho que é melhor uma boca marcada pela alegria do que pela tristeza, chateação ou mau-humor. Pessoas tristes tem a boca em forma de 'u' (de cabeça para baixo) e eu prefiro aquela representação linda dos cadernos de desenho da pré-escola - bonequinhos de palito, dando-se as mãos e na cabecinha de bola uma grande linha curva - um sorriso de engolir as orelhas.


"Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô."
Adélia Prado